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Capítulo 1
• A Banda dos Chorões: de Anacleto a Carramona
• Albertino Pimentel, o Carramona
• As bandas nas suas primeiras décadas
Capítulo 2: A Banda no Tempo de Pinto Jr.
Agradecimentos
A Banda do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro � uma das principais, sen�o a mais importante banda da hist�ria musical do pa�s. Fundada por Anacleto de Medeiros em 1896, continua at� hoje enchendo de orgulho seus admiradores e os m�sicos que dela fizeram ou ainda fazem parte.
Este ensaio sobre sua vistosa e vitoriosa trajet�ria n�o poderia ser realizado sem o patroc�nio cultural da Petrobr�s e sua parceria com a Arte_Fato Produto Cultural, a quem agradecemos pela oportunidade da pesquisa.
Agradecemos tamb�m aos 143 m�sicos atuais da Banda, que nos acolheram e se dispuseram a colaborar com a pesquisa desde o in�cio. Nosso muito obrigado ao diretor do Centro Hist�rico e Cultural do Corpo de Bombeiros do Estado do Rio de Janeiro, Cel. Luiz Fernando da Silva, ao maestro titular Tnte. Efrahim Magalh�es Berto, ao 2� Sgt. Mizael de Jesus Lobato e ao 1� Sgt. Gilson da Silva Moura.
N�o poder�amos esquecer de agradecer aos nossos depoentes, que cederam seu tempo e suas memórias ao projeto: Ant�nio Candido Sobrinho, Carlos Gomes, Gilson da Silva Moura, Jos� C�ndido da Costa, Marcos Campos, Silvino Lemos, Jos� Ant�nio de Souza e Oth�nio Benvenuto. E a todos aqueles que direta ou indiretamente colaboraram no preenchimento de mais uma lacuna na hist�ria musical carioca.
IntroduÇÃo
Texto: Andr� Diniz / Evelyn Chaves
Conservat�rio do povo, deposit�ria de tradi��es, museu vivo de nosso passado musical. Assim podemos come�ar a falar em banda de m�sica, tema que, embora de tanta import�ncia, tem sido pouco explorado por pesquisadores de nossa m�sica popular, talvez pelo seu car�ter polimorfo.
Mas o que � uma banda? Como e quando surgiram as primeiras?
A rigor, banda de m�sica � um conjunto constitu�do de instrumentos de sopro (madeira e metal) e percuss�o. No que diz respeito � etimologia, banda, bando e bandeira t�m a mesma origem: prov�m da raiz germ�nica bandwa, que significa bandeira ou estandarte. Do italiano, banda passou ao franc�s e mais tarde a outras l�nguas latinas, tamb�m dando origem ao ingl�s band.
Foi apenas no s�culo XIX que as bandas adquiriram o car�ter que t�m at� hoje, inclusive na Europa. Um dos principais respons�veis por essa atualiza��o foi o criador do saxofone, o franc�s de origem belga Adolfo Sax.
Antes disso, as bandas de m�sica mais antigas, compostas por instrumentos de sopro e percuss�o, eram chamadas tamb�m de charamelas. Calamus ou charamela s�o nomes latinos dados � flauta r�stica, instrumento muito utilizado at� o final do s�culo XVIII, que se dividia em tr�s tipos: a bastarda, a m�dia e a pequena.
Segundo Vicente Salles, � muito prov�vel que o termo charamela tenha dado origem � palavra charanga, nome muitas vezes pejorativo, que serve para designar as bandas de m�sica de cidades do interior ou ainda qualquer banda de m�sica desafinada.
No Brasil, as bandas de m�sica, tal e qual as conhecemos atualmente, s�o fruto do s�culo XIX. Quando D. Jo�o deixou Portugal, em 1807, trouxe consigo a Banda da Brigada Real, que, segundo Vicente Salles, �embora modelada � maneira antiga n�o deixava de constituir grande exemplo para as organiza��es similares no Brasil�. [1]
Mas nosso pa�s tinha seus grupos musicais desde a �poca colonial. Os conjuntos de p�fanos, ou ternos, datam dessa �poca. O terno, tamb�m chamado de ter�o, costumava reunir tr�s naipes: a flauta, o cavaquinho e o viol�o. Interessante notar que essa forma��o se estendeu � �poca do choro e das serenatas, mais recentemente.
Foi com o decreto de D. Jo�o, em 27 de mar�o de 1810, que as bandas ganharam novo f�lego no pa�s, e come�aram a se disseminar. Pelo decreto, todos os regimentos militares ficavam obrigados a ter uma banda de m�sica, com composi��o variando de 12 a 16 executantes. A partir de 1814, tem in�cio a difus�o do ensino e da pr�tica de instrumentos mais atualizados.
Dentre as in�meras bandas surgidas no Rio de Janeiro do s�culo XIX, podemos destacar: Bella Harmonia, Prazer Nova Aurora, Recreio dos Artistas, Club Est�cio de S�, Estrela do Norte, Recreio de S�o Crist�v�o, Progresso do Engenho de Dentro e Congresso Flor de S�o Jo�o.
Atualmente, as bandas podem ser de dois tipos: civis ou militares. Entre as civis, existem as bandas marciais, em geral pertencentes a col�gios, e as fanfarras. Uma fanfarra � constitu�da quase que pelos mesmos instrumentos que comp�em uma banda de m�sica. A diferen�a reside na exclus�o, na fanfarra, de todos os instrumentos de palheta, exceto os saxofones. Em alguns casos, quando s�o introduzidos instrumentos de cordas, como por exemplo o violoncelo e o contrabaixo, a banda de m�sica � ainda filarm�nica.
Verdadeiras escolas da arte, as bandas de m�sica v�m contribuindo de forma inestim�vel para a preserva��o da cultura nacional, seja descobrindo novos talentos ou incentivando o interesse pela m�sica. Muitos grandes vultos da m�sica universal tiveram como rito de passagem a banda de m�sica. Como forma de ilustra��o, podemos citar Verdi, que foi mestre de banda de m�sica na It�lia. [2] No Brasil, vale registrar que um dos nossos maiores compositores populares, Luiz Gonzaga, come�ou sua vida musical como corneteiro do ex�rcito, dele dando baixa em 1939.[3]
Intimamente ligadas � hist�ria da nossa m�sica popular, as bandas contribu�ram para o abrasileiramento de muitas dan�as europ�ias que aqui chegaram no s�culo XIX, como a polca, a valsa, a mazurca e a quadrilha.
Al�m disso, como nos lembra Ricardo Tacuchian, v�rios g�neros musicais, como o choro, se bandizaram e gra�as a esse fen�meno se conservam at� hoje.[4]
Entretanto, com o advento da m�sica pop, do rock e dos instrumentos eletr�nicos, as m�sicas de banda perderam espa�o no mercado. Ricardo Tacuchian, em pesquisa realizada em 1982, registra que, no Rio de Janeiro, das 103 bandas civis catalogadas no Departamento de Cultura do Estado at� aquela data, apenas 30 estavam em atividade, muitas vezes de maneira prec�ria e irregular.
N�o elitiz�vel por sua pr�pria natureza, se assentando no contexto popular, fonte de lazer e centro formador de m�sicos, as bandas fazem parte de nossa hist�ria, de nossa cultura e, em �ltima inst�ncia, de nossa identidade.�
Este ensaio tem como objetivo resgatar e sobretudo reafirmar a import�ncia das nossas bandas de m�sica, mais especificamente a Banda do Corpo de Bombeiros do Estado do Rio de Janeiro, fundada em 1896.
No primeiro cap�tulo, apresentamos os anos iniciais da Banda, que teve como fundador ningu�m menos que Anacleto de Medeiros, maestro seguido por Albertino Pimentel, o Carramona. Era a �poca da Banda dos chor�es.
Em seguida, a Banda no tempo de Pinto J�nior, maestro que esteve � frente da mesma por muitos anos; grande compositor, transcritor e arranjador.
O que Pinto Jr. fez com a Banda, em termos de afirma��o no cen�rio musical da �poca, s� seria revivido com Oth�nio Benvenuto, personagem central do terceiro e �ltimo cap�tulo, que acompanha a trajet�ria da Banda at� os anos 70.
Cap�tulo 1
A Banda dos Chor�es: de Anacleto a Carramona
"Anacleto de Medeiros
Ingratamente olvidado
Que nunca apagaste inc�ndios
Mas com teu fogo sagrado
Acendias harmonias
Regendo a banda gloriosa
Dos invenc�veis bombeiros..."
(Catulo da Paix�o Cearense, poeta, letrista e seresteiro).
N�o � de hoje que o Rio de Janeiro � apontado como espa�o musical definidor de gostos pelo pa�s. Capital da Col�nia, do Imp�rio e da Rep�blica � at� a inaugura��o de Bras�lia �, a cidade, l�rica em sua conjun��o de florestas, mares e montanhas, foi palco da sistematiza��o da modinha, com o poeta Caldas Barbosa, do surgimento do "choro", com o flautista Joaquim Callado, do surgimento do samba, com Sinh�, Donga, Ismael, da primeira fonogr�fica brasileira, a Casa Edison, das principais emissoras de r�dio, como a Mayrink Veiga e a R�dio Nacional, da Bossa Nova, com Jo�o, Vin�cius e Tom, enfim, dos mais relevantes g�neros musicais brasileiros que em solos cariocas nasceram ou encontraram o melhor caminho para sua divulga��o.
Era ent�o de se esperar que uma cidade que come�ava a tra�ar os seus perfis culturais abrigasse, ao final do s�culo XIX � mais precisamente em 1896 �, o surgimento da mais importante banda de m�sica da antiga capital da Rep�blica: a do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro.
Um of�cio do Ministro da Justi�a Dr. Alberto Torres, no Governo Presidencial de Prudente de Moraes, autorizava, em resposta ao pedido do Ten. Cel. Eug�nio Rodrigues Jardim, comandante interino do Corpo de Bombeiros, a cria��o da primeira banda da corpora��o. A Banda estreou na inaugura��o do Posto de Bombeiros de Humait�, em 15 de novembro de 1896, com vinte e cinco m�sicos, regida pelo Sargento Azevedo, auxiliar daquele que seria o principal organizador do grupo, o maestro Anacleto de Medeiros.
Anacleto Augusto de Medeiros pode e deve ser considerado o maestro das bandas do Rio de Janeiro, visto que ficou � frente de in�meras delas. Estudou m�sica no Arsenal de Guerra do Rio de Janeiro e depois aperfei�oou seus conhecimentos no Conservat�rio de M�sica � posteriormente chamado de Escola Nacional de M�sica �, tendo como companheiro de classe o maestro Francisco Braga.
As aulas no Arsenal eram ministradas pelo chor�o Santos Bocot, autor da valsa Teresinha, que incutiu na forma��o musical do menino Anacleto a adora��o pelo que conhecer�amos nos anos de 1920 como choro. No Conservat�rio de M�sica, Henrique Alves de Mesquita foi professor de Anacleto, contribuindo em muito para edificar no jovem aluno a adora��o pela m�sica.�
A bem da verdade, a linha musical que o professor Santos Bocot imprimiu na forma��o de Anacleto � uma das principais matrizes de nossa m�sica popular. O choro, ou chorinho, surgiu ao final do s�culo XIX na cidade do Rio de Janeiro, com as composi��es e interpreta��es de Joaquim Callado, Chiquinha Gonzaga, Ernesto Nazar� e do pr�prio Anacleto, que utilizavam seus instrumentos para dar um sabor �carioca� �s polcas, valsas, x�tis e mazurcas europ�ias. O g�nero era uma fus�o dos ritmos africanos e europeus.
Nos primeiros anos do s�culo XX, Pixinguinha, considerado o maior nome do choro, consolidou o ritmo que depois teria como um de seus pilares o compositor Jacob do Bandolim. O choro transformou-se em celeiro privilegiado de excepcionais instrumentistas e compositores.��
Assim, n�o era de se estranhar que o chor�o, maestro e multiinstrumentista Anacleto de Medeiros � que na realidade gostava mais de tocar sax-soprano � levasse para o repert�rio da Banda as composi��es em voga no choro.�
Ele tamb�m profissionalizou m�sicos que tocavam dispersos em diferentes grupos da cidade. Irineu de Almeida, ou Irineu Batina, primeiro professor do genial Pixinguinha, integrou a Banda tocando oficleide ao lado dos m�sicos Lu�s de Souza (cornetim e trompete) Candinho do Trombone, Casemiro Rocha (pistonista e compositor), Li�a (bombard�o), Irineu Pianinho (flauta), Edmundo Ot�vio Ferreira (requinta) e Jo�o Ferreira de Almeida (bombardino), entre tantos outros chor�es.
Com tino musical apurado, Anacleto de Medeiros fez com que a Banda do Corpo de Bombeiros se destacasse das demais pela afina��o e pelos arranjos mais sofisticados. Basta ouvir as grava��es da Casa Edison (primeira fonogr�fica brasileira criada em 1902 pelo tcheco Frederico Figner) das m�sicas A Turuna e Jandira, de Felisberto Marques, Avenida, Cabe�a de Porco, Despedida e Iara, do pr�prio Anacleto, e Brejeiro, de Ernesto Nazar�, para comprovar a qualidade musical da Banda.
Criador do x�tis brasileiro, o maestro passou a ser conhecido e admirado na cidade do Rio de Janeiro. O poeta popular Catulo da Paix�o Cearense, autor com Jo�o Pernambuco de Luar do Sert�o, letrou in�meras de suas melodias, grande parte delas ap�s a morte do maestro, com destaque para Yara, conhecida posteriormente como Rasga Cora��o. Villa-Lobos utilizou esta melodia no seu Choros 10.
Maior m�sico das Am�ricas no XIX, o brasileiro Carlos Gomes n�o cansava de elogiar Anacleto. Assim o jornal Gazeta de Not�cia, do dia 13 de julho de 1906, relatou: "O saudoso Carlos Gomes quando esteve hospedado na ilha de Paquet� era incans�vel em elogiar o talento musical de 'seu caboclo' [Anacleto de Medeiros], como tratava o grande maestro..."
Anacleto de Medeiros deixou quase uma centena de composi��es conhecidas, entre polcas, valsas, x�tis, tangos, dobrados, mazurcas e marchas, perfazendo o rico caminho da musicalidade carioca. Suas melodias eram executadas por bandas de todo o Brasil, reafirmando a import�ncia das corpora��es musicais na divulga��o do nosso repert�rio popular. Para citar apenas algumas p�rolas do mesti�o fiquemos com o dobrado Jubileu, o tango Bo�mios, os x�tis Benzinho e Olhos matadores e as polcas Tr�s estrelas e Quiproqu�.�
�Infelizmente, a pesquisa que realizamos n�o encontrou nenhuma pe�a original sua nos arquivos da Banda. Segundo Antonio Augusto, music�logo da pesquisa, �em carta endere�ada ao escritor e music�logo Baptista Siqueira, datada de 7 de novembro de 1967, o Capit�o Benvenuto, ent�o mestre da Banda do Corpo de Bombeiros, relaciona as obras do compositor que constavam no Acervo da Banda. Entre elas figuram a fantasia 28 de Fevereiro, e a quadrilha No Baile, que n�o foram encontradas�.
Entretanto, a pesquisa localizou tr�s obras ainda n�o relacionadas na bibliografia musical do maestro: Os M�rtires de Canudos, S�o Sebasti�o e Noite de Luar.��
Tamb�m foram encontrados uma marcha do professor de Pixinguinha, Irineu de Almeida, intitulada Arthur Azevedo, um arranjo feito por Anacleto da �pera O Guarani, de Carlos Gomes, e um arranjo da marcha Triumphal, de Assis Pacheco. Mas nenhuma partitura. Esse resultado decorre principalmente dos seguintes fatores: a) o maestro coordenava muitas bandas na cidade � Banda de Mag�, da F�brica de Chitas Bangu, da F�brica de Tecidos Macacos e da Sociedade Recreio Musical Paquetaense, entre outras � portanto, possivelmente ele levava a partitura de um lado para outro, desfalcando o acervo da corpora��o; b) com a transfer�ncia de parte dos m�sicos da Banda em 1963 para a nova capital da Rep�blica, Bras�lia, � poss�vel que muitas partituras tenham sido jogadas fora ou mesmo extraviadas; c) o manuseio e extravio de partituras por parte de indiv�duos que se achavam no direito de t�-las em seu poder. Para a memória da Banda e da m�sica popular carioca, h� um elo perdido que talvez n�o recuperemos mais.
Anacleto de Medeiros morreu no dia 14 de agosto de 1907, aos 41 anos, e foi enterrado em sua Paquet�, no Rio de Janeiro. Ficou � frente da Banda do Corpo de Bombeiros por 11 anos, quando foi substitu�do interinamente pelo compositor e professor de obo�, maestro Agostinho Luiz de Gouv�a, e logo em seguida pelo chor�o, maestro e pistonista Albertino Pimentel Ign�cio Carramona, o primeiro regente efetivamente militar da Banda.�
Albertino Pimentel, o Carramona
No come�o do s�culo XX, o choro era um estilo musical presente na sociedade carioca. Os chor�es tocavam nas festas de anivers�rio, nos batizados, nos casamentos, no teatro de revista � acompanhando os cantores �, nos arrasta-p�s, nas bandas e nas casas musicais, fosse para vender partituras ou para uma boa roda de choro, regada a improvisa��o, desafios e muito balan�o � tra�os marcantes do g�nero.
Na secular Loja Cavaquinho de Ouro, existente at� hoje, os chor�es faziam sua morada. Uma passada por l� podia render um encontro com a conhecida Turma do Cavaquinho de Ouro, Anacleto, Juca Kalut, Quincas Laranjeiras (renomado professor de viol�o da Capital), o mestre Villa-Lobos (que deu ao g�nero um vi�s acad�mico) e com Albertino In�cio Pimentel Carramona. Este maestro, que substituiu o falecido Anacleto de Medeiros, continuou a obra do fundador da Banda ap�s 1910: manteve-a formada por instrumentistas de choro e executando composi��es ao estilo do maestro anterior.
Carramona era pistonista, regente e compositor. Sua forma��o musical era resultado do aprendizado na Casa dos Meninos Desvalidos e na pr�pria Banda do Corpo de Bombeiros, cujo comando assumiu dez anos depois de seu ingresso em 1900. Vale tamb�m destacar o aprendizado que teve nas in�meras rodas de choro da cidade, visto que esta � a tradicional escola de m�sicos melodiosos e harm�nicos.
A viv�ncia musical na cidade fez de Carramona um apaixonado pelo Rancho Ameno Resed�, o mais conhecido rancho da Hist�ria, para o qual comp�s uma polca de mesmo nome. Os ranchos eram agrupamentos carnavalescos, descendentes do pastoril, que inclu�am instrumentos de corda e de sopro, porta-estandarte, coro para entoar a marcha-rancho, mestre-sala etc. O bom entendedor j� p�de perceber que os ranchos foram os precursores da escolas de samba.
Consciente de sua importante tarefa � frente da Banda ap�s a morte de Anacleto de Medeiros, Carramona manteve a excel�ncia dos m�sicos da corpora��o e a tradi��o de compor polcas, choros, mazurcas, valsas e outros g�neros populares. Comp�s tamb�m um dobrado em homenagem ao mestre, intitulado memórias de Anacleto. V�rias outras cria��es suas ficaram no repert�rio popular: Albertina, Fantasia do Luar, Hiranda, Recorda��es de Lili, Recorda��es de Paquet�, Coralina...
Alexandre Gon�alves Pinto, chor�o das primeiras d�cadas do s�culo XX, diz, em seu livro de memórias, que Albertino In�cio Pimentel Carramona �(...) tornou-se um ex�mio professor, compositor e continuador do seu inesquec�vel mestre (Anacleto), tendo-lhe substitu�do no n�vel de igualdade...�[5]
Nas pesquisas para este trabalho descobrimos que a �memória� foi um pouquinho mais generosa com as composi��es de Albertino que ficaram na Banda, em compara��o com Anacleto. Dentre as composi��es e arranjos que encontramos, podemos destacar Nossa P�tria, Dr. Marques Porto, Zaranga e Dr. Souza e Silva.
Carramona morreu no ano de 1929, aos 55 anos de idade. A Banda j� estava h� tr�s anos sob o comando do 2� Tenente maestro Antonio Pinto J�nior.
As bandas nas suas primeiras d�cadas
�Estava � toa na vida O meu amor me chamou Pra ver a banda passar Cantando coisas de amor.� (A Banda, Chico Buarque)
As bandas tiveram um papel important�ssimo no universo da cultura musical brasileira. No caso espec�fico do Rio de Janeiro, as corpora��es musicais atuaram no campo do lazer, da profissionaliza��o e da divulga��o.
No in�cio do s�culo XIX, em um Rio que ainda parecia colonial, sem estruturas diversificadas de lazer, as apresenta��es das bandas da cidade significavam momentos raros de audi��o p�blica do repert�rio popular e erudito. Sem r�dio ou televis�o, contando apenas com os grupos de choro espalhados pela cidade e as apresenta��es do teatro musicado da Pra�a Tiradentes, a popula��o ficava aguardando as democr�ticas exibi��es dos �soldados de fogo�.
A Banda do Corpo de Bombeiros apresentava-se em festas c�vicas, religiosas e concertos, tocando um repert�rio abrangente que englobava trechos de �pera, adaptados para esta forma��o, marchas, dobrados, polcas, valsas, mazurcas e x�tis. Havia uma forte influ�ncia musical europ�ia que aos poucos seria substitu�da pela americana.
Grande parte do repert�rio popular vinha de compositores da pr�pria Banda ou de nomes reconhecidos na cidade como: Chiquinha Gonzaga, Henrique Alves de Mesquita (professor de uma gera��o de m�sicos renomados da cidade) e Francisco Braga (autor do hino da bandeira).��
Pioneira em mat�ria de divulga��o, a Banda do Corpo de Bombeiros foi o primeiro grupo instrumental no Brasil a gravar um disco de 78rpm, na Casa Edison, em 1902. Para al�m da qualidade imposta por Anacleto de Medeiros, a boa afina��o e os arranjos bem elaborados, as bandas tinham mais facilidade de gravar porque a pot�ncia do seu som era registrada com mais facilidade e precis�o no sumo da cera � a grava��o era mec�nica e s� em 1927 surgiria a grava��o el�trica.
Uma vez que a Banda tinha grande relev�ncia nas suas apresenta��es e grava��es musicais, ela representava muitas vezes o �nico ref�gio para a profissionaliza��o do m�sico. Como vida de m�sico n�o era muito f�cil e a profissionaliza��o da classe estava apenas engatinhando na cidade, as bandas eram os espa�os que possibilitavam a sobreviv�ncia com dignidade desses artistas. N�o fosse a prolifera��o de bandas militares e civis no Rio de Janeiro, grande parte desses profissionais de fato n�o poderia viver de m�sica.
�Al�m da sobreviv�ncia, a banda era quase uma escola p�blica do ensino musical. Desde a Col�nia, o ensino da m�sica estava mais ligado � Igreja ou aos senhores que fomentavam em seus escravos o cultivo musical. H� in�meros exemplos de fazendas que tinham uma banda e muitas ficaram conhecidas, j� na �rea urbana e com um estilo de m�sica mais popular e espont�neo, como banda de barbeiros � grupos que sa�am pela cidade tocando, sobretudo em festas religiosas.
A defici�ncia de escolas musicais tamb�m era suprida por institui��es como o Asilo dos Meninos Desvalidos, internato destinado a recolher e educar meninos de 6 a 12 anos. Os meninos asilados tinham aula de m�sica e a banda da institui��o era considerada uma das melhores da Capital. Pelo Asilo passaram Francisco Braga, Candinho do Trombone, Albertino Pimentel e Paulino Sacramento, entre tantos outros meninos-m�sicos.��
Outra escola que formou grande parte da gera��o de Anacleto de Medeiros e Albertino Pimentel foi o Conservat�rio de M�sica. N�o raro, alunos de outras institui��es iam concluir seu aprendizado no Conservat�rio, um dos poucos estabelecimentos de m�sica mantidos pelo governo. Este foi o caso, por exemplo, de Francisco Braga.
O Conservat�rio de M�sica funcionou inicialmente no Museu Nacional, na Pra�a da Rep�blica, passando posteriormente, em 1855, a ocupar um espa�o dentro da Academia de Belas Artes; finalmente, em 1872, ganhou sede pr�pria na Rua Lampadosa, atual Lu�s de Cam�es, no Centro do Rio de Janeiro. Hoje, com o nome de Escola de M�sica, pertence � Universidade Federal do Rio de Janeiro, tendo sua sede no bo�mio bairro da Lapa... Nele se formaram Joaquim Callado, Pat�pio Silva e Anacleto de Medeiros, por exemplo, sob a batuta de Henrique Alves de Mesquita.
A �banda� foi a professora e a guardi� financeira de milhares de jovens m�sicos, deixando qualquer outra institui��o no chinelo, como se diz.
Cap�tulo 2
A Banda no Tempo de Pinto Jr.
Os anos 20 marcaram de forma acintosa a vida cultural no Rio de Janeiro e no mundo. O cinema de Hollywood, o jazz, as dan�as da moda como o tango, o fox-trot, o charleston, as orquestras e o r�dio eram parte fundamental da vida de milh�es de consumidores.
A sociedade carioca ganhou corpo em suas camadas m�dias, o que acabou por gerar diversos espa�os de lazer musical: os cines, os chopp-cantantes e o cada vez mais concorrido e elaborado teatro de revista. No �mbito fonogr�fico, o surgimento da grava��o el�trica resultou no melhor registro da voz. Cantores como Francisco Alves, M�rio Reis e Orlando Silva passaram a fazer parte do cotidiano de milhares de f�s. Foi ainda um tempo em que os chor�es tocavam em jazz bands e entravam na Era do R�dio conhecidos como Regionais.
� no contexto dos Anos Loucos, como ficou conhecida a d�cada de 1920 pelo mundo, que assume o comando da Banda do Corpo de Bombeiros o maestro Antonio Pinto Junior. Em 1923 assumiu como contra-mestre, sendo efetivado como maestro em 1926. Pinto Jr. ficou � frente da Banda por mais de 18 anos, ao todo, encerrando sua carreira em 1944, �s v�speras do fim da Segunda Grande Guerra Mundial.
Por mais que n�o tivesse tanta notoriedade na imprensa como Anacleto e Carramona, o maestro Antonio Pinto Junior desempenhou um trabalho important�ssimo na reestrutura��o da Banda, na sua divulga��o pela cidade e, de certa forma, at� pelo pa�s.�
Atrav�s de concurso, a Banda aumentou seu efetivo para 60 m�sicos. O perfil continuava sendo o daqueles que buscavam acolhida material no quartel dos bombeiros. Com o crescimento do efetivo, aumentou tamb�m o naipe de instrumentos da corpora��o. Instrumentos antes nunca usados, como o saxofone baixo, passaram a fazer parte das orquestra��es.
O pr�prio Pinto Jr. come�ou a escrever in�meros arranjos. Um caso not�rio foi o da orquestra��o completa para grande banda do hino Nacional Brasileiro, preparado para atender a um pedido do Departamento de Guerra dos Estados Unidos ao Estado Maior do Ex�rcito Brasileiro, em 1927 (nesse ano a Banda sagrou-se campe� no concurso das bandas militares). O trabalho exaustivo do maestro pode ser constatado no levantamento que nossa pesquisa fez dos arranjos que escreveu. � dele, sem d�vida, uma nova defini��o de apresenta��o da Banda, onde a m�sica erudita posa como mat�ria-prima ao lado da popular nas audi��es.� O ecl�tico Pinto Jr. escreveu arranjos de praticamente todos os g�neros: Fantasia da �pera Os escravos, de Carlos Gomes, A ternura do Mar, valsa de Eduardo Souto, Batuque, de Ernesto Nazar�, Florisbela, marcha de Nassara e Fraz�o, Linda Lourinha, de Jo�o de Barro, e O Barbeiro de Sevilha, de Rossini, para finalizar com apenas alguns exemplos.
� claro que esse ecletismo nos arranjos simboliza muito do que a Banda tocava e do que o maestro Pinto Jr. continuou fazendo em suas composi��es: criou dobrados, como Jos� Cust�dio Pinto e Descentraliza��o � este em homenagem � inaugura��o da corpora��o do Humait�, em 1929 �; o hino em homenagem aos bombeiros, Soldados do Fogo; a marcha 2 de julho de 1921, S�rie de Cantos Populares, Choro.... e dezenas de composi��es mais ao gosto erudito.
� relevante destacar que n�o h� registro, ao menos nos arquivos da Banda pesquisados e nos jornais da �poca, de que Anacleto de Medeiros e Carramona tenham escrito m�sica para o teatro de revista. Em contrapartida, h� todos os ind�cios de que o maestro Pinto J�nior o tenha feito. S�o freq�entes arranjos seus para as m�sicas de Eduardo Souto, conhecido musicista da Pra�a Tiradentes, local de concentra��o dos teatros. Mas foi para Luiz Peixoto, outro not�rio escritor das revistas (textos musicados), que o maestro comp�s o batuque Boi�i�, apresentado no Teatro Recreio em 1932 (depois, ele seria gravado em disco).
S� para pontuar a import�ncia das revistas no Rio de Janeiro, elas desenvolveram o papel de excel�ncia de apresenta��o das novidades musicais. Tornaram-se uma coqueluche e durante muito tempo, at� a consolida��o do r�dio, arrastaram milhares de pessoas para as suas diversificadas e hilariantes apresenta��es. Passado algum tempo, as pe�as do teatro de revista, com montagens cada vez mais caprichosas e luxuosas, acabaram por intensificar a produ��o cultural no Rio de Janeiro, atraindo uma massa crescente de espectadores e abordando o cotidiano com tal for�a que refletiam nos palcos a auto-imagem do carioca: malandro, sensual e dono de uma dic��o particular.
Mas voltemos a Pinto Jr. No aspecto da divulga��o da Banda, o maestro passou a contar com um aliado de peso: o r�dio. Em 1922, o Rio de Janeiro foi palco da primeira transmiss�o radiof�nica brasileira. A experi�ncia pioneira aconteceu na comemora��o do centen�rio de nossa Independ�ncia, e o discurso do ent�o presidente da Rep�blica, Epit�cio Pessoa, foi transmitido pelas ondas hertzianas (ondas magn�ticas), alcan�ando os ouvintes de Niter�i, Petr�polis e S�o Paulo. � noite, o p�blico que lotava a gigantesca exposi��o do centen�rio ouviu extasiado, por meio de alto-falante, a �pera O Guarani, de Carlos Gomes, transmitida diretamente do Teatro Municipal.
Como primeiro ve�culo de comunica��o de massa, o r�dio tornou-se parte do cotidiano de seus ouvintes, passando do entretenimento � divulga��o de valores pol�ticos e culturais. Abriu tamb�m um grande mercado de trabalho para compositores, cantores, instrumentistas e arranjadores, gerando uma demanda emergencial de forma��o de artistas talentosos. R�dios como a Mayrink Veiga e a Nacional eram refer�ncia de audi�ncia.
� na r�dio Mayrink Veiga, por sinal, que a Corpora��o dos Bombeiros inaugura o seu programa di�rio. Sob a dire��o do Ten. Humbaud, o programa A Hora do Bombeiro abordava desde como evitar inc�ndios at� not�cias da corpora��o. Muitos m�sicos eram convidados para fazer parte do programa, o que deve ter estimulado a forma��o de pequenos grupos musicais oriundos da Banda. O quinteto de saxofone, premiado � �poca, deve ter surgido da necessidade de grupos menores para agilizar o transporte e encaix�-los em espa�os de audi��o mais compactos. Pinto Jr. chegou at� a escrever um Choro Estilizado Para Quinteto de Saxofones.
Al�m dos convites para datas comemorativas, desfiles e entretenimento do povo, a Banda fazia uma grande apresenta��o p�blica no Est�dio do Vasco da Gama, em S�o Janu�rio, todo ano. Durante o Estado Novo (1937-45), per�odo pol�tico comandado pelo ditador Get�lio Vargas, o governo organizava pelas m�os de Villa-Lobos uma reuni�o de bandas e corais no Est�dio para celebrar a unidade e a consci�ncia c�vica do pa�s. Ali n�o era o espa�o da troca de id�ias e sim do discurso de Get�lio, que louvava os trabalhadores com sua pol�tica populista e autorit�ria. A Banda do Corpo de Bombeiros era mais uma alegoria para enfeitar a �festa� do Presidente.
Ouso dizer que se Anacleto idealizou a Banda e o maestro Albertino Pimentel deu corpo a esses nobres ideais, foi, sem d�vida alguma, Antonio Pinto J�nior que consolidou a legitimidade da Banda na sociedade. O aumento do efetivo, a compra de in�meros instrumentos, a diversifica��o de repert�rio, em grande parte obra sua, e as quase duas d�cadas � frente da corpora��o com apresenta��es em todos os cantos possibilitaram ao maestro desenvolver o papel que s� seria outra vez revivido na reg�ncia do maestro Oth�nio Benvenuto. O que Pinto Jr. fez na primeira metade do s�culo XX o Capit�o Benvenuto realizar� no per�odo posterior � constru��o de Bras�lia. Mas isso � papo para outro cap�tulo.
Cap�tulo 3
A Banda de Benvenuto
�No tempo imperial surgiu
uma briosa corpora��o
exemplo edificante de bravura sem igual
que sob o alvirrubro pend�o
cumpre a sua sagrada miss�o
de contra as chamas dantescas lutar
e vidas e riquezas alheias salvar�
(Samba-enredo da Escola de Samba Aprendizes de Lucas, 1958.)
Quando Pinto J�nior deixou a Banda, foi substitu�do por Il�dio Ant�nio do Nascimento, que por sua vez deu lugar a Adjalme Rodrigues da Silva, professor da Escola Nacional de M�sica e obo�sta da Sinf�nica Brasileira. Foi sob sua batuta que a Banda come�ou a gravar os famosos LP�s de marcha-rancho, que fizeram muito sucesso na �poca. Sucesso que continuou com seu sucessor, Luiz Paulo da Silva. Bombardinista, foi tamb�m tubista da orquestra do Teatro Municipal e m�sico da R�dio Nacional. Fez parte ainda da banda de Altamiro Carrilho � grande mestre do choro. Foi sob sua reg�ncia que a banda alcan�ou o pr�mio de melhor LP nos anos de 1958, 1959 e 1960, al�m de conquistar o primeiro lugar de vendagem de discos com o LP Estas tamb�m s�o de Rancho. Depois de Luiz Paulo, foi a vez do bombardinista Dyonisio Rosa Reis ficar � frente da Banda e ter seu nome gravado na memória da cidade do Rio, por ser o orquestrador da vers�o oficial do hino Cidade Maravilhosa.
Em dezembro de 1962, a Banda passou a ter como maestro Oth�nio Benvenuto.
Nascido em Jardim, Cear�, em 1925, Benvenuto come�ou tocando trompa, mas logo se apaixonou pelo obo�, instrumento que tocou at� se tornar regente.
Quando a capital do pa�s se transferiu para Bras�lia, os m�sicos da Banda tiveram de optar entre continuar no servi�o federal (indo para Bras�lia), ou ficar no Estado da Guanabara. Como lembra o pr�prio Benvenuto, �em raz�o disso s� ficaram dois m�sicos no Estado da Guanabara, o sargento m�sico Ramos e eu, que na �poca era segundo tenente. Isso no in�cio do ano de 1963�.[6]
Benvenuto teve que organizar uma nova Banda, composta de m�sicos bastante jovens. O efetivo passou de 60 para 80 m�sicos, uma nova estrutura foi montada e a Banda passou a ser sinf�nica. Com rela��o aos instrumentos, tamb�m houve novidades: a introdu��o da harpa e o aumento de fagotes, clarinetes e percuss�o. Um sargento arranjador e outro orquestrador tamb�m foram introduzidos.
Os �rduos ensaios com os novos m�sicos valeram a pena: em 1965, a nova banda conquistou o primeiro lugar no concurso de bandas militares. A partir da�, os anos foram memor�veis, com viagens, concertos etc.
Em outubro de 1972, por exemplo, o jornal O Globo anunciava a II Temporada de Primavera da Banda do Corpo de Bombeiros: �Domingo pr�ximo, no Teatro Jo�o Caetano, com entrada franca, �s 10 horas da manh�, a Banda Sinf�nica do Corpo de Bombeiros inicia sua II Temporada da Primavera. O programa deste primeiro concerto ser� constitu�do inteiramente de grandes aberturas. Uma delas ser� a 1812, de Tchaikowski, para cuja execu��o a Banda mandou confeccionar um bombo gigante, para imitar os canh�es previstos pelo autor da partitura. �Ser� o maior bombo do mundo�, diz o maestro Oth�nio Benvenuto, que reger� a s�rie. [...]�
Num domingo, 5 de agosto de 1973, o mesmo jornal anunciava a despedida de Benvenuto: �... o velho mestre despede-se da banda�. Benvenuto deixou o Rio, onde era tamb�m professor de composi��o e reg�ncia do Conservat�rio Brasileiro de M�sica, para ser professor da Universidade Federal de Santa Maria, Rio de Grande do Sul.
Com Benvenuto, a Banda chegou a ter renome internacional, e foi apontada pelo maestro Hilmar Schatz, diretor musical da TV de Baden-Baden, da Alemanha, como a melhor banda militar do mundo, suplantando a dos carabineiros da Fran�a.
Conclus�o
Quando iniciamos o trabalho sobre a Banda do Corpo de Bombeiros, sab�amos dos desafios que t�nhamos ao pesquisar a mais importante banda de m�sica da Hist�ria do Brasil. Dificuldades tivemos muitas, mas, passados alguns meses do in�cio da pesquisa, a riqueza de documentos e informa��es foi tranq�ilizando os nossos planejamentos e a pr�pria elabora��o do texto.
Trabalhamos com quatro fontes de pesquisa, complementares entre si: escrita, iconogr�fica, discogr�fica e entrevistas. Entrevistamos mais de 7 m�sicos que tiveram uma liga��o importante com a Banda. Geralmente maestros, muitos deles j� com idade avan�ada, �personagens� do dia-a-dia da corpora��o; a fonte escrita passou tanto por jornais e revistas de �poca quanto por textos mais elaborados que refletiam sobre a import�ncia da Banda no pa�s; a iconografia foi encontrada na pr�pria institui��o, em jornais de �poca e em museus, como o da Imagem e do Som; no tocante � discografia, revisitamos toda a produ��o fonogr�fica da Banda.
O fim da elabora��o do texto, j� com as informa��es da pesquisa musical, reafirmou-nos a validade e a pertin�ncia do projeto.� Em sua exist�ncia, a Banda sempre mostrou a capilaridade musical com a cidade do Rio de Janeiro. Seus maestros, muitos deles famosos no pa�s inteiro � como � o caso de Anacleto de Medeiros �, compuseram polca, x�tis, valsa, choro, maxixe, samba, opereta, m�sica para o teatro de revista e relacionadas ao repert�rio cl�ssico. A forma como acolheu e formou m�sicos na cidade p�e a Banda como umas das principais escolas do Rio de Janeiro e do Brasil. E essa hist�ria, felizmente, vai ficar para sempre.��
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Entrevistados:
· Antônio Candido Sobrinho, em 13 de abril 2004. Trompa.
· Carlos Gomes, em 20 de abril de 2004. Trompa.
· Gilson da Silva Moura, em 03 de junho de 2004. Piano.
· José Antônio de Souza, em 30 de novembro de 2004. Clarineta.
· Maestro José Cândido da Costa, em 17 de abril de 2004.Trombone.
· Maestro Othônio Benvenuto, em 10 de outubro de 2004. Oboé.
· Maestro Silvino Lemos, em 20 de fevereiro de 2004. Clarineta.
Entrevistadores:
� Andr� Diniz
� Evelyn Chaves
ASubtenente Jos� Ant�nio de Souza, em 30 de novembro de 2004. Cs entrevistas
Entrevistadores: Seu Ant�nio, gostar�amos que o sr. come�asse dizendo seu nome completo, a data e o local de seu nascimento.
Ant�nio Candido: Ant�nio Candido Sobrinho, nasci no dia 21 de mar�o de 1934, na cidade de Itaperuna, estado do Rio de Janeiro.
E: Como o sr. come�ou a se interessar pela m�sica?
AC: Come�ou na minha casa, a minha fam�lia tem muitos m�sicos. Meu pai e meus tios tinham uma banda de m�sica, e isso garantia uma renda extra para a fam�lia. Eu tinha um irm�o mais velho que j� tocava, e eu desde pequeno ia dormir com a orquestra ensaiando. Com 11 anos eu comecei a aprender m�sica � primeiro teoria musical, com o meu pai, e depois, e s� depois, peguei no instrumento. L� em casa, quando a gente come�ava a aprender a ler meu pai j� come�ava a ensinar m�sica.
E: E o sr. come�ou tocando qual instrumento?
AC: Foi curioso, eu comecei no saxofone tenor, mas eu n�o me adaptei, e ent�o passei para o trompete (ali�s eu gosto de falar pistom). Ele comprou um pistom pra mim, todo amarrado com esparadrapo, n�s �ramos pobres... Mas o instrumento ficou pendurado na parede at� eu aprender a teoria. E eu quando ensino algu�m tamb�m fa�o isso. N�o pode tocar sem saber m�sica, sem saber o �chute� inicial. O instrumento o aluno escolhe depois. Eu ia para escola, e tr�s vezes por semana meu pai �tomava� li��o do que ele havia me ensinado. Quando eu comecei a tocar, me juntei � orquestra do meu pai. �s vezes a gente errava, mas eles deixavam, com o tempo a gente aprenderia. De vez em quando aparecia o circo na cidade, e a gente ia tocar. O repert�rio era curioso, diferente da que a gente tocava na orquestra. Toc�vamos tamb�m para fazer a propaganda de queima de estoque das casas Pernambucanas, isso sem falar nos bailes de carnaval de Itaperuna e nas cidades vizinhas.
E: E como o sr. veio para Banda do Corpo de Bombeiros?
AC: No dia 16 de mar�o de 1950 eu cheguei ao Rio de Janeiro, com 16 anos. Meu irm�o mais velho j� morava aqui, tocava na Banda da Pol�cia Militar (e tamb�m tinha uma irm� que j� havia casado e morava aqui no Rio). Chegando ao Rio de Janeiro, meu irm�o me apresentou � cidade, me ensinou a andar nos bondes etc. E eu fiquei morando com ele. Certo dia fui tocar num baile no Clube dos Democr�ticos, na Rua do Riachuelo, substituindo um m�sico da Banda do Corpo de Bombeiros, o Osmani da Silva, na �poca primeiro sargento, solista do pistom. E o irm�o do Osmani foi substituir o Luiz Paulo da Silva, que mais tarde viria a ser o maestro da Banda do Corpo de Bombeiros. Depois do baile, o rapaz que teria que me pagar n�o me pagou. Ent�o eu fui � secretaria do Clube reclamar que o rapaz da orquestra n�o havia dado o meu dinheiro. Ele foi at� o tal rapaz e finalmente recebi meu dinheiro. Ent�o o rapaz da secretaria me perguntou onde eu tocava, e respondi que acabava de chegar ao Rio, ainda n�o tinha emprego fixo. E ele me convidou para tocar l� nesse Clube aos domingos. E eu fui. Chegando l�, conheci o Osmani e o Luiz Paulo, que me convidaram para ir conhecer e fazer um teste na Banda do Corpo de Bombeiros. Fui com o meu irm�o conhecer a Banda. O maestro da �poca, o Adjalme, me pediu para tocar algumas m�sicas. Ele gostou e disse que eu j� estava pronto para tocar na Banda. Mas naquela ocasi�o, n�o pude entrar de imediato � tinha apenas 16 anos. Tive que esperar completar 17 anos e fazer as provas (oral, escrita e pr�tica). No dia 7 de maio de 1951 eu �sentei pra�a�, comecei na Banda. Na �poca o maestro era o Adjalme Rodrigues Silva. Ele era fant�stico, e eu acredito que hoje as pessoas cometem uma injusti�a ao n�o lembrarem dele, porque ele inovou, revolucionou o repert�rio de banda de m�sica. N�o sei por que a pessoas n�o lembram disso. As bandas antigamente tocavam mais trechos de �peras, repert�rios simples. O Adjalme achou que aquele repert�rio estava antiquado para a Banda, e com ele come�amos a tocar um outro repert�rio. Isso, fora as marchas-rancho, que era o repert�rio popular e que venderam muito. Come�amos a tocar marchas-rancho com ele e terminamos com o Luiz Paulo. Viajamos o Brasil todo, inclusive viagens internacionais, devido ao sucesso das marchas-rancho. Ganhamos pr�mios que n�o sei nem contabilizar. Toda semana receb�amos da Record o trof�u Arroz Brejeiro, dado aos que mais tocavam. Ganhamos v�rios concursos, a Banda n�o parava, era muito solicitada. E nos destac�vamos das demais, na medida em que as outras selecionavam um conjunto (os melhores m�sicos), pra tocar em alguns eventos. N�s n�o, �amos sempre com toda a Banda. Ent�o, acredito que o Adjalme tem que ser lembrado, por causa da transforma��o que ele fez no repert�rio da Banda.
E: E o Luiz Paulo como maestro, como foi?
AC: Foi muito bom tamb�m, era muito solicitado fora da Banda. Era um bombardino de primeira linha. Gravou com Altamiro Carrilho, Lamartine Babo, Carmem Miranda, s� para citar alguns. Ele n�o ficou muito tempo � frente da Banda, porque ele passou a ser tubista no Teatro Municipal. Quando eu entrei no Teatro Municipal, ele estava para completar os 70, e ter a aposentadoria compuls�ria. Mas eu ainda cheguei a tocar com ele uns dois anos no Teatro Municipal. Na �poca dele gravamos um disco de muito sucesso, s� com sambas de Ary Barroso (nesse LP tem um solo de pistom meu). Tenho at� hoje todos os discos e de vez em quando sento para ouvir. O �ltimo LP que eu gravei foi com o Batista.
E: E depois do Luiz Paulo?
AC: Veio o Dionisio Rosa Reis, que tamb�m ficou pouco tempo, dois anos. O Dionisio n�o era um m�sico executante extraordin�rio, mas era um �timo administrador. � aquele neg�cio: um m�sico bom �s vezes peca na administra��o, e vice-versa.
E: E foi na �poca do Dion�sio que a Banda foi para Bras�lia?
AC: A Banda n�o chegou a ir para Bras�lia. A gente ia, ficava um tempo e voltava.
E: Mas havia como optar por Bras�lia ou Rio?
AC: Sim. O que houve foi uma m� interpreta��o da Lei Santiago Dantas, que na verdade dizia para voc� optar por Bras�lia para voc� garantir os seus direitos federais. Eu j� estava h� 9 anos no servi�o federal, n�o queria perder esse tempo, e n�o me interessava passar do servi�o federal para o estadual. Ent�o eu fui para Bras�lia, mas a cidade naquela �poca era praticamente desabitada, n�o tinha muito trabalho para a gente. At� que em 1967 o Castelo Branco assinou um conv�nio, e quem quis regressou para o Rio de Janeiro permanecendo com o v�nculo federal. Foi o que eu fiz. Mas n�s ficamos uns tr�s ou quatro anos nesse vai e volta de Bras�lia.
E: E quando o sr. voltou, o Oth�nio Benvenuto era o maestro da Banda. A Banda j� havia sido �refeita�?
AC: Sim, j� era uma Banda nova. J� havia sido at� campe� do concurso do Maracan�zinho, em 1965. E com o Benvenuto foi �timo, fui primeira trompa por muitos anos, at� eu me aposentar. Gravei com muita gente, Chico Buarque, Tom Jobim, Vin�cius de Moares, Mi�cha, Elizeth Cardoso, o especial do Roberto Carlos eu fazia todo ano na Globo. Acho que talvez se eu tivesse continuado no pistom, n�o tivesse essas oportunidades � havia muitos trompetistas excelentes naquela �poca.
E: E depois do Benvenuto o sr. teve o Batista como mestre?
AC: Foi. Mas o Batista eu j� conhecia. E o meu naipe de trompas n�o tinha nenhum problema. E o meu amigo, o Batista, deu continuidade ao Benvenuto. De forma que eu sa� daqui em 1979 e fui para o Teatro Municipal. E hoje acabo de me aposentar pelo Teatro, atrav�s da aposentadoria compuls�ria. Depois do Batista veio o C�ndido, meu irm�o, mas eu j� estava fora. Infelizmente eu n�o toquei com ele, mais um pouco e ele seria meu mestre. E vale dizer que fui eu quem o trouxe para a Banda do Corpo de Bombeiros.
E: E o maestro Pinto Jr., o sr. chegou a conhec�-lo?
AC: Sim, eu acredito que o Pinto Jr. deu uma nova din�mica � Banda. Ele se tornou maestro muito novo, e ficou muito tempo � frente da Banda. E ele era �timo, era arranjador, transcritor, compositor. Ele fez a transcri��o do Hino Nacional, e foi promovido a capit�o por causa disso. Depois que ele saiu daqui, cheguei a encontr�-lo e conversar com ele algumas vezes. As composi��es dele eram �timas, tem uma s�rie de dobrados fant�stica, sensacional. E isso est� gravado, eu tenho em casa.
E: Se o sr. tivesse que escolher no m�ximo tr�s maestros, quais o sr. destacaria?
AC: Como maestro, o melhor foi o Adjalme. Depois vem o Benvenuto.
E: E a Banda hoje, o sr. tem contato?
AC: Sim, de vez em quando eu venho aqui. Eu quase n�o conhe�o mais ningu�m, um dos poucos � o maestro atual, o tenente Efraim, e meus dois sobrinhos que s�o sargentos aqui. A qualidade, acredito que tenha ca�do um pouco, principalmente pela falta de incentivo. Parece que as autoridades se esqueceram da import�ncia das bandas no cen�rio musical brasileiro. Antigamente, por exemplo, no interior do estado do Rio n�o existia um munic�pio que n�o tivesse uma banda de m�sica. Hoje em dia a situa��o � lament�vel.
E: Ocorreram transforma��es com rela��o aos instrumentos? Alguns foram introduzidos, outros abolidos...?
AC: Existia por exemplo o saxhorne, uma esp�cie de bombardino pequeno, mas que n�o tocava, porque a tonalidade dele era em mibemol, e o instrumento de sopro em determinados tons fica ruim, porque o tom fica longe do d� do piano. O saxhorne foi extinto porque n�o tinha fun��o, era chamado de pica-pau, porque n�o saia do mesmo ritmo. Isso foi com o Benvenuto. Teve tamb�m o oficleide, um instrumento de bocal com sapatilhas, que foi abolido h� muito tempo. A tuba em mibemol tamb�m acabou � agora quase todo o instrumento de banda � em sibemol, porque fica mais f�cil de afinar e observar as notas. E outros foram incorporados, como a harpa, o violoncelo, o contrabaixo de cordas � isso tudo com o Benvenuto. O contrabaixo de cordas amacia o som das tubas, n�o fica um som estridente. E agora, mais recentemente, o piano, xilofone, vibrafone, que n�o tinha. Essas transforma��es aconteceram principalmente com o Benvenuto, que foi fundamental pra Banda. Havia dinheiro, vend�amos muitos LP�s (compramos dois instrumentais completos s� com o dinheiro dos LP�s), chegamos a vender um milh�o de discos naquela �poca. E o dinheiro era revertido para o Corpo de Bombeiros, que fazia chegar � Banda.
Entrevistadores: N�s gostar�amos que o sr. come�asse dizendo o seu nome completo, a data e o local onde o sr. nasceu.
Carlos Gomes: Eu nasci em Salvador, em 31 de dezembro de 1932.
E: Como o sr. se envolveu com a m�sica?
CG: Meu pai era m�sico, apaixonado por m�sica. Mas n�o era desejo dele que eu fosse m�sico profissional. Na maneira dele pensar, eu deveria seguir uma carreira que me desse ganhos economicamente, como direito, medicina ou engenharia. Eu cheguei at� a me esfor�ar, cheguei a cursar dois anos de Farm�cia. Mas o destino quis que eu fosse m�sico. Eu lembro que apareceu uma pessoa querendo vender uma trompa, meu pai comprou e deu para minha irm�. Entretanto, eu tinha um tio que tocava viol�o � ele viu que minhas irm�s n�o queriam saber de m�sica e me deu o instrumento para eu tocar. Eu j� sabia a parte te�rica � aprendia com as aulas particulares que meu pai dava em nossa casa para seus alunos � mas n�o sabia tocar instrumento algum. E com essa trompa eu comecei a tocar choro, samba. At� que um dia um amigo de meu pai quis me levar para a banda dele. Ele era maestro de uma banda de uma igreja protestante. Eu fui e gostei bastante, tocava como solista. E com 16 anos eu comecei a ganhar dinheiro. Meu pai fazia parte da Orquestra Sinf�nica da Bahia e o maestro pediu que eu fosse fazer um est�gio, tocando trompa. O resultado foi que eu acabei sendo titular. Nesse per�odo, o Villa-Lobos chegou � Bahia � procura de jovens talentos de instrumento de sopro para ir estudar na Fran�a. Fui apresentado ao Villa-Lobos e ele gostou da minha maneira de tocar, levando em considera��o que eu tinha um instrumento muito ruim, muito velho. Lembro que ele fez uma aposta comigo, de brincadeira. Disse: �voc� sabe tocar mesmo esse instrumento, menino?�. Eu disse: �sei�. Meu pai me disse para tocar o solo de Tosca. Eu toquei bem. Era muito jovem, n�o tinha medo � afinal de contas, n�o tinha nem id�ia, naquela ocasi�o, da grandiosidade de Villa- Lobos... Ele se virou pra mim e disse que eu iria morar com ele na Fran�a. Quando ele chegou ao Rio de Janeiro, providenciou a documenta��o e enviou para Salvador. Mas nunca recebi. Morava num lugar muito pobre, n�o havia como as correspond�ncias chegarem, pois n�o t�nhamos um �endere�o�. As correspond�ncias eram entregues na base da �casa do fulano�, do �sicrano�. Acredito que as pessoas que receberam a documenta��o l� em Salvador tinham inveja � eu vim a saber isso depois. Um deles era at� compadre do meu pai. Mandaram ent�o uma segunda chamada, mandaram duas professoras me procurarem. At� que apareceu um representante do Minist�rio da Educa��o. Ent�o eu recebi uma passagem e vim para o Rio, e a bolsa para a Fran�a ficou suspensa at� o ano seguinte, pois j� havia esgotado o prazo para eu ir. E eu fiquei muito feliz aqui. Vir para o Rio foi como se fosse ter ido pra Fran�a. Fui estudar com o professor Benzaquem, fiz o curso na Escola de M�sica. Mas eu precisava ganhar dinheiro, ter um emprego. E foi f�cil escolher um lugar: a Banda do Corpo de Bombeiros. Tinha uma vaga h� dois anos �me esperando�. Isso foi em 1954. E a Banda foi o para�so, pois eu j� era aluno da Escola de M�sica. Me desenvolvi tanto que entrei na Banda fazendo a quarta trompa e em pouco tempo comecei a fazer a primeira. Depois de cinco anos na Banda, decidi fazer o concurso para a Orquestra do Teatro Municipal. Passei e optei pelo Teatro. Embora ganhando menos, preferi trocar. Logo depois a Banda teve que ir para Bras�lia, com a mudan�a da capital. E o Oth�nio Benvenuto teve que refazer a Banda.
E: Quando o sr. entrou, o maestro era o Adjalme?
CG: Sim, e ele adotou uma coisa muito importante para a Banda: um repert�rio sinf�nico. Tocava-se sempre coisas mais popularescas e com ele come�ou-se a tocar Beethoven, entre outros. A Banda teve o apoio de muitos m�sicos de orquestras. O pr�prio Adjalme era um grande oboista da Sinf�nica.
E: E as marchas-rancho, come�am com quem?
CG: Depois do Adjalme. Porque o Corpo de Bombeiros estava fazendo 100 anos, e tentou-se recuperar parte da hist�ria da Banda, a memória do Anacleto come�ou a ser invocada. A grava��o das marchas-rancho foi uma contribui��o do maestro Paulo. Ele era m�sico da R�dio Nacional, tocava bombardino muito bem. E chamou o Pinto J�nior pra fazer os arranjos.
E: Parece que o Pinto Jr. tamb�m foi important�ssimo para a Banda, ficou muito tempo...
CG: Muito importante, pegou todo o per�odo da ditadura de Vargas. Eu cheguei a conhec�-lo. Mesmo depois de aposentado, visitava sempre a Banda. Chegou a reger a Banda, como convidado, algumas vezes, nessa �poca das marchas-rancho. Ent�o o Luis Paulo pegou esse per�odo comercial e a Banda ganhou muito dinheiro. N�s viajamos muito, ganhamos disco de ouro em S�o Paulo e em outras capitais, nos mais diversos lugares. Chegamos at� a conhecer o Pixinguinha, que tamb�m estava recebendo um pr�mio numa ocasi�o, assim como n�s. Nessa ocasi�o foram entregues dois pr�mios, um para Banda e outro para o Pixinguinha, e tocamos juntos. Foi um per�odo intenso, a Banda ficou muito famosa. Fomos chamados inclusive para tocar na festa do anivers�rio de 400 anos de S�o Paulo.
E: E as bandas hoje, perderam sua import�ncia?
�CG: Veja bem, as bandas n�o perderam sua import�ncia art�stica, mas a m�sica popular ficou reduzida ao pessoal das guitarras. As marchas-rancho foram vend�veis, mas foi um risco. Tanto que os demais LP�s n�o venderam bem � o �ltimo LP comercial, se n�o me engano, foi com o Benvenuto. Mas n�o eram todos os m�sicos da Banda que gravavam e viajavam, era um conjunto selecionado. Tocamos algumas vezes em prociss�es... Eu cheguei a tocar at� no Candombl�, no terreiro do Jo�ozinho da Gom�ia. Quando o santo baixou, n�s tocamos um dobrado... Isso eu n�o esque�o. Mas a Banda dos Bombeiros sempre foi a melhor do Brasil, desde que ela foi fundada. Somente em alguns momentos ela n�o era a melhor.
E: E a disciplina militar, existia na Banda?
CG: Olha, na �poca em que eu estava l�, a farda n�o tinha muito peso. A rela��o era de amizade. Voc� tinha liberdade de discutir uma afina��o, um arranjo, com o maestro. Poderia ter a hierarquia, mas o neg�cio funcionava melhor sem o clima de ordem, de hierarquia, de disciplina militar. Eu peguei dois maestros � o Adjalme e o Paulo � e dois comandantes � o Saddock de S�, que era absolutamente f� da banda, dava �carta branca� pro maestro, e o Souza Aguiar, que era mais rigoroso e fazia quest�o de que a hierarquia fosse respeitada, mesmo na Banda.
�E: Na sua opini�o, quais os maestros mais importantes da banda?
�CG: Na minha opini�o, o Anacleto. Tinha uma banda pequena, com poucos m�sicos. Na �poca do Benvenuto, chegou a ter 200, porque ele queria v�rias bandas em uma: uma de elite, outra para tocar em eventos de menor destaque... O Benvenuto teve �carta branca� do governador para refazer a Banda em tr�s meses. E ele fez uma banda espetacular, colocou harpa, piano, bateria completa, e a Banda passou a ser sinf�nica. Nessa �poca, o governo investiu muito dinheiro na Banda.� Depois veio o Jo�o Baptista Gon�alves, e, em seguida, o Candido, que era excelente maestro.
E: E depois veio o Silvino...
CG: �, o Silvino � um grande m�sico.
E: E a Banda hoje, o sr. tem contato, assiste �s apresenta��es?
CG: Eu assisto aos concertos. Na �poca do Silvino, houve um processo de sele��o rigoros�ssimo, ele colocou muitos bons m�sicos l� dentro. E foi quando as mulheres entraram para a Banda � antes n�o era permitido. E a qualidade se manteve.
E: Mudando de assunto, o sr. se lembra de alguns instrumentos que deixaram de ser utilizados?
CG: Alguns instrumentos deixaram de ser tocados, mas o Benvenuto os trouxe de volta (corne ingl�s, saxofone contrabaixo, clarineta em contrabaixo). Porque a nossa instrumenta��o � francesa; os americanos s�o mais simples. E na minha opini�o, o n�mero ideal para uma banda � 90 m�sicos.��
3. Entrevistado: Gilson da Silva Moura, em 03 de junho de 2004.
Entrevistadores: Gilson, n�s gostar�amos que voc� come�asse dizendo seu nome completo, o local e a data onde voc� nasceu.
Gilson da Silva Moura: O meu nome � Gilson da Silva Moura, nasci em 6 de novembro de 1959, no Rio de Janeiro, capital.
E: Como voc� se interessou pela m�sica?
GSM: Meu pai tocava cavaquinho; meu av�, viol�o. Minha fam�lia toda gostava de m�sica. Um tocava pandeiro, outro cantava... Ent�o eu cresci ouvindo e vendo a minha fam�lia tocar e comecei a estudar m�sica. Ganhei um �mini-acorde�o� � eu falava que era acorde�o de brinquedo, mas era de verdade, s� que era pequeno, de seis baixos e apenas uma oitava. Eu ia para o jardim de inf�ncia, aprendia aquelas m�sicas que a gente cantava toda hora: para entrar, para sair, para ir para o recreio... E com mais ou menos seis anos de idade eu comecei a tocar as melodias daquelas m�sicas. At� que a minha pr�pria professora do jardim me colocou para estudar piano. Ela falou com a minha m�e e eu comecei no Conservat�rio de M�sica, no meu bairro, Olaria.
E: Por que o piano?
GSM: Porque do acorde�o eu comecei a tocar um piano de brinquedo, e eu me identifiquei com o piano. Mas � claro que eu n�o estudei piano a minha vida toda, havia momentos em que eu parava, tocava outros instrumentos, fazia outras coisas. At� que eu decidi viver da m�sica e adotei definitivamente o piano.
E: Como e por que voc� veio pra Banda do Corpo de Bombeiros?
GSM: Eu j� conhecia a Banda porque a minha fam�lia tinha os discos de marcha-rancho. Meu tio admirava a Banda. Na �poca que eu entrei, a Banda fazia concertos sinf�nicos, e alguns eu tive a oportunidade de assistir, com o Cap. Batista. Ent�o eu entrei para a Faculdade de M�sica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), um dos meus colegas j� era m�sico daqui e ele me falou do concurso, que haveria vaga para pianista. Nessa �poca, o Corpo de Bombeiros tinha um Coral, aberto � comunidade, que precisava de um pianista para os ensaios. As duas vagas de pianista eram para assessorar o Coral, criado pelo Cap. Baptista, maestro da Banda nessa �poca. O Coral era grande, cerca de 80 vozes, aproximadamente. A prova foi bastante dif�cil e muito concorrida � para piano eram oito candidatos concorrendo a duas vagas. Quando eu vim pra Banda, estudei obo�, al�m de ensaiar o Coral. Estudei obo� durante seis meses, das 8 da manh� �s 4 da tarde � s� parava pra almo�ar � e ent�o passei a integrar a banda como segundo oboista. Toquei obo� na Banda durante 5 ou 6 anos, mais ou menos. Depois eu comecei a tocar os instrumentos de percuss�o de teclado: xilofone, marimba, vibrafone, entre outros. Isso porque os pianistas t�m certa facilidade para aprender os instrumentos chamados barraf�nicos. Fiquei na percuss�o at� o ano passado, quando o atual regente, o tenente Efraim, me chamou para fazer o trabalho de rela��es p�blicas da Banda. Atualmente, al�m de rela��es p�blicas, estou reunindo a documenta��o da Banda para montar futuramente uma exposi��o permanente no nosso Centro Hist�rico, na medida em que a Banda est�, desde o ano passado, diretamente subordinada ao Centro Hist�rico. Mas independentemente disso eu sempre gostei de pesquisa hist�rica. Esse book que eu te mostrei, com recortes de jornal desde a d�cada de 1970, comecei a fazer na �poca da gest�o do Cap. C�ndido, h� mais de 10 anos. O intuito, naquela ocasi�o, era angariar fundos para uma nova viagem � Alemanha � eles ofereceram as despesas que a Banda teria na Alemanha e s� ter�amos que conseguir as passagens a�reas. O primeiro passo foi a cria��o de uma comiss�o, para pedido de patroc�nio, e ent�o fizemos esse book de apresenta��o da banda.
E: Voltando um pouco, gostaria que voc� falasse sobre o Cap. Baptista como maestro.
GSM: Eu entrei no �ltimo ano da gest�o do Cap. Baptista. O meu relacionamento com ele era muito bom. Ele valorizava os m�sicos, principalmente aqueles que se esmeravam, que se dedicavam. Era um bom administrador, se preocupava em manter a Banda em evid�ncia, na m�dia. Ele mesmo se encarregava disso: ia para os jornais, conhecia v�rios jornalistas...� O Cap. C�ndido tamb�m foi um excelente maestro, m�sico. Amigo dos m�sicos, uma pessoa muito boa. Sempre tive boas rela��es com todos os oficiais que estiveram � frente da Banda. Depois do Cap. C�ndido foi o Cap. Silvino. Tive a oportunidade de participar do CD lan�ado pela Banda, interpretando cl�ssicos. E nesse trabalho eu participei de todas as etapas, desde a licita��o at� a distribui��o. Eu sinto um enorme prazer ao falar desse CD. O Cap. Silvino confiou no meu trabalho, em todos os sentidos: chamar a pessoa para fazer a mixagem, a produ��o do CD (indiquei o Eduardo Monteiro), a libera��o dos direitos autorais, a confec��o da capa, o contato com a f�brica, para que ela entregasse os CD�s no dia do lan�amento. Fizemos um coquetel de lan�amento do CD aqui no Centro Hist�rico. Na v�spera, os CD�s ainda estavam na f�brica, em S�o Paulo, e eu fiquei a tarde toda ligando para v�rias empresas de transporte para trazer os CD�s... At� que finalmente na v�spera do lan�amento, � noite, eles chegaram. Eu trabalhei muito nesse projeto, mas valeu a pena: o produto final � muito elogiado. E, al�m disso, mostrei meu trabalho como pianista.
E: E o Coral, como foi ensai�-lo?
GSM: Foi uma experi�ncia maravilhosa. Entrei na Banda e logo fui ensaiar o Coral. Eu tinha somente 21, 22 anos, e a minha �nica experi�ncia com coral foi participando, cantando. Nunca havia ensaiado. Claro, n�o havia a proposta de o Coral se tornar profissional, o objetivo era integrar a comunidade. A maioria dos coristas era de pessoas de meia-idade ou mais velhos um pouco, e, nesse sentido, foi um desafio � um garoto novo tendo que dirigir pessoas mais velhas. A gente aprende muito com isso, as v�rias vertentes da m�sica, o lado � digamos assim � terap�utico. Porque aquelas pessoas que vinham n�o ganhavam nada, vinham porque realmente gostavam da m�sica, de se integrar em um grupo, gostavam de cantar. E voc� poder ajudar, fazer com que o grupo cres�a... Foi muito valiosa a experi�ncia.
E: Na �poca do Cap. C�ndido a Banda ia muito �s escolas?
GSM: Sim, e continua at� hoje. As escolas ligam e a Banda atende aos pedidos na medida do poss�vel, de acordo com a nossa agenda. Os concertos em escolas s�o muito bons, porque existe um trabalho did�tico, os instrumentos e os compositores s�o apresentados. A aceita��o � muito boa.
E: E com rela��o ao repert�rio, mudou alguma coisa entre um maestro e outro?
GSM: O Cap. C�ndido acrescentou m�sicas mais populares ao repert�rio do Cap. Baptista. Em linhas gerais, podemos dizer que a Banda ampliou seu repert�rio de alguns anos pra c�. Acredito que o Cap. Benvenuto e o Cap. Baptista mantiveram um repert�rio mais erudito.
E: E os instrumentos, mudaram?
GSM: Quando eu entrei aqui, havia um naipe de violoncelos, e hoje n�o existe mais. E tamb�m o saxofone contrabaixo n�o � mais usado. No final da gest�o do Cap. Silvino, ele conseguiu a aquisi��o de um contrabaixo el�trico, uma guitarra e um teclado, utilizados nas m�sicas populares.
E: Como voc� avalia a import�ncia das bandas hoje no nosso cen�rio musical?
GSM: N�s vivemos num pa�s de tradi��o de banda. As bandas nunca v�o perder sua import�ncia. N�o � como na Alemanha, onde as crian�as come�am a aprender violino com 5 anos de idade e toda cidade tem sua orquestra de violinos. No Brasil, prevalecem os instrumentos de sopro e a banda tem um papel fundamental nesse contexto. Os sopros caracterizam a banda (clarinetas, flautas, sax, entre outros). Acho que cabe aqui um pedido, o de se investir mais nas bandas. Um dos caminhos � esse, as bandas sempre tiveram sua for�a de express�o, de uma cidade, de um povo, e isso n�o se acaba, n�o vai acabar.
4. Entrevistado: Jos� Antonio de Souza, em 30 de novembro de 2004.
Entrevistadores: Gostar�amos que o senhor come�asse dizendo seu nome completo, data e local de nascimento.
Jos� Ant�nio de Souza: Meu nome � Jos� Ant�nio de Souza, nasci no Rio de Janeiro, em 30 de setembro de 1960.
E: Como o sr. se interessou pela m�sica?
JAS: Foi atrav�s dos amigos. A Igreja que eu freq�entava tinha uma banda e eu comecei a me interessar pelos instrumentos. O sonho das crian�as que freq�entavam a Igreja era um dia tocar na banda. E o curioso foi que eu peguei o primeiro instrumento que me caiu nas m�os. N�o tive tempo de escolher, de aprender outros para ent�o escolher. Se hoje um bom instrumento j� � caro, imagina h� trinta anos atr�s. Ent�o eu j� comecei com o clarinete, tanto que continuei, fiz bacharelado e mestrado com o clarinete. E tamb�m ningu�m na minha fam�lia era m�sico, eu fui o primeiro a me interessar. A clarineta tocada normalmente � a de 13, ou ent�o 23 chaves, mas a minha era de 23 el�sticos, porque era toda remendada. Somente no in�cio dos anos 80 foi que meu pai viu que a m�sica era uma coisa s�ria pra mim e me deu um bom instrumento de presente.
E: E como o sr. veio para a Banda do Corpo de Bombeiros?
JAS: Eu conhecia amigos que j� trabalhavam aqui. O meu professor de teoria musical tocava na Banda. Na �poca, eu trabalhava em banco, era banc�rio, e ent�o ele me avisou que haveria um concurso. Eu estudei muito e consegui passar. Eram mais de 200 candidatos inicialmente, e ficamos em seis. O concurso foi em 1981. Entrei aqui em julho desse ano. J� s�o 23 anos de Banda. Atualmente, estou na parte administrativa.
E: Quando o sr. entrou quem era o maestro? Quais as lembran�as que o sr. tem dessa �poca?
JAS: O maestro era o Jo�o Baptista, que tinha um envolvimento grande com o lado erudito, a parte sinf�nica da Banda. A Banda tocava muita �pera, trechos de �peras, poemas sinf�nicos, aberturas de �peras. Estava sempre na m�dia, eram muitos os concertos, sempre lotados, no Teatro Municipal. Havia o Projeto Aquarius, patrocinado pela Globo, que era muito divulgado.
E: E depois veio o maestro C�ndido. Como era com ele? O que mudou?
JAS: N�o aconteceram grandes mudan�as � o maestro C�ndido seguiu a mesma linha que j� vinha sendo posta em pr�tica pelo Jo�o Baptista. A diferen�a era que ele era rec�m-formado no curso de reg�ncia e o repert�rio ficou um pouco mais pesado, dif�cil. Mas era bom o desafio. Ele fazia com que a gente tocasse m�sicas de Villa-Lobos, que eram dif�ceis at� para grandes Orquestras. Os transcritores tiveram bastante trabalho para adaptar algumas m�sicas para a Banda.
E: E com o maestro Silvino, como foi?
JAS: O Silvino manteve o repert�rio erudito, mas foi uma �poca dif�cil para a Banda, materialmente falando. O Silvino era extremamente competente e estudioso, mas as coisas eram dif�ceis, os sal�rios estavam defasados e a infra-estrutura da Banda piorou. As verbas eram escassas, muito embora no final de sua gest�o a Banda tenha conseguido um instrumental todo novo. Uma mudan�a grande foi somente com o tenente Efrahim, o nosso atual maestro, que introduziu instrumentos eletr�nicos na Banda, e o repert�rio ficou mais popular.
E: E o Pinto Jr., o que se fala sobre ele?
JAS: Principalmente sobre reg�ncia e transcri��es, que ele fazia muitas e como ningu�m. Ele foi o que mais fez esse tipo de trabalho, adaptar m�sicas de orquestras para a Banda tocar. At� hoje tocamos transcri��es feitas por ele.
E: E sobre o Anacleto? Ele � lembrado pela Banda hoje?
JAS: Foi um her�i, montou uma banda exemplar, com excelente repert�rio. Tocamos at� hoje m�sicas suas, que s�o, por incr�vel que pare�a, atuais. At� hoje, nos concertos, tocamos pelo menos uma m�sica do Anacleto. Fizemos at� uma vez um concerto com a forma��o da Banda do Anacleto e tocamos s� m�sicas que ele executava.
E: E a Banda hoje, voc�s fazem muitos concertos, viajam?
JAS: As viagens continuam, mas, na maioria das vezes, com um n�mero reduzido de m�sicos. Porque � caro custear passagem, estadia, alimenta��o para 70, 80 m�sicos. Algumas prefeituras nos chamam e depois acabam desistindo. Ent�o come�amos a fazer nossos concertos de C�mara, ou seja, levando um n�mero reduzido de m�sicos.
E: Queria que o sr. finalizasse falando sobre a import�ncia das bandas hoje. A banda que o sr. come�ou tocando na adolesc�ncia, ainda existe?
JAS: Sim, existe at� hoje, adequando-se aos tempos atuais. A banda hoje � importante porque desperta nas crian�as o gosto pela m�sica. Acho que as crian�as, em qualquer idade, deveriam aprender um instrumento. S� no Brasil as crian�as n�o t�m aulas assim. A m�sica � sadia para as crian�as, ajuda na concentra��o, em tudo.
5. Entrevistado: José Cândido da Costa , em 17 de abril de 2004.
Entrevistadores: Maestro, pedimos para o sr. come�ar dizendo seu nome completo, a data e o local onde o sr. nasceu.
Jos� C�ndido: O meu nome � Jos� C�ndido da Costa, nasci na cidade de Itaperuna, estado do Rio de Janeiro, no dia 3 de outubro de 1943. Vim para o Rio de Janeiro em 1952.
E: Como come�ou sua rela��o com a m�sica?
JC: Eu venho de uma fam�lia �musical�. Meu pai e todos os meus tios eram m�sicos. Eles e mais alguns amigos tinham um conjunto. L� em casa somos seis irm�os, todos m�sicos, assim como v�rios primos. Com nove anos, comecei a estudar m�sica. Profissionalmente, optei pelo trombone, mas antes estudei saxofone e trompete. Meu pai me deu as primeiras aulas de teoria, depois meu irm�o. S� fui estudar formalmente depois de me tornar m�sico profissional. Um dos meus primeiros empregos era o que hoje em dia chamamos de office-boy (mas eu ia trabalhar e levava o trombone). Eu trabalhava na Volvo do Brasil, e certa vez houve um anivers�rio de uma funcion�ria, e eu entrei na sala do diretor tocando. Eu acabei sendo demitido. Ent�o decidi que seria melhor viver da m�sica. Meu irm�o j� tinha um conjunto... E come�amos a ganhar algum dinheiro. Com 17 anos comecei a tocar num conjunto de uma igreja que eu freq�entava, em Iraj�. E com 20 anos, em 29 de outubro de 1963, entrei para o Corpo de Bombeiros. O maestro na �poca era o Oth�nio Benvenuto.
E: Nessa �poca a Banda tinha sido transferida para Bras�lia?
JC: Eu entrei com mais 17 m�sicos, incluindo um irm�o meu, que tamb�m tocava trombone. A prova era rigorosa, exigia bastante do candidato, e � assim at� hoje. Ent�o aconteceu o seguinte: depois de 6 meses, os 18 passaram a 3� sargento. Nessa �poca, a capital estava se transferindo para Bras�lia, os bombeiros que haviam entrado na corpora��o antes dessa data poderiam optar pelo servi�o estadual ou federal. Com isso, em dezembro de 1963, �ramos um total de 20 sargentos m�sicos (os 18 e mais dois que optaram pelo servi�o estadual), e mais o maestro, o Benvenuto. Ent�o, n�o havia banda, e n�s come�amos a fazer servi�o de bombeiro mesmo... At� meados de 1964.
E: E como a Banda foi reconstru�da?
JC: Come�aram os concursos e em junho de 1964 a Banda completou sua forma��o. Dessa forma, o Benvenuto pode ser visto como �o segundo Anacleto�. E eu comecei a fazer cursos, fiz um curso t�cnico, fiz o curso superior na Escola de M�sica da UFRJ, fiz os concursos internos e fui subindo de patente. Teve �poca que enfrentei dificuldades, porque fazia faculdade, tinha prova no mesmo dia em que a Banda tinha que viajar, por exemplo... Mas como a Banda tinha um hor�rio flex�vel (o expediente � somente pela manh�), eu consegui terminar os cursos.
E: E o hor�rio sempre foi assim, ou de manh� ou de tarde?
JC: Sempre, porque voc� veja bem: para voc� formar um m�sico, os ensaios di�rios n�o podem ultrapassar duas, tr�s horas... Porque o m�sico tem que estudar, tem que fazer uma sess�o de relaxamento antes de tocar... Ent�o foi isso, fui fazendo provas, subindo de patente, estudando e participando de orquestras, conjuntos de c�mara, fora do Corpo de Bombeiros. At� porque ajudava a aumentar a renda familiar, al�m, � claro, da experi�ncia que voc� adquire. Em 1980, eu j� havia terminado o meu curso de reg�ncia, e abriu concurso para oficial. Era uma vaga s� e eu fui aprovado. Comecei como maestro adjunto � o maestro da Banda na �poca era o Cap. Batista.
E: N�o foi em 1980 a excurs�o � Alemanha? O sr. foi tamb�m?
JC: Fui. Mas foi muito cansativo. �s vezes n�s faz�amos tr�s fun��es num dia, eu ficava meio chateado com essa hist�ria. Isso me tirou um pouco o encanto da viagem. Mas foi uma experi�ncia boa para a Banda.
E: Ent�o o sr. fez a prova para maestro adjunto...
JC: Pois �, e em 1983 foi meu primeiro concerto. O Cap. Batista estava enfermo, inclusive hospitalizado, e eu assumi a Banda nessa ocasi�o. E, por incr�vel que pare�a, foi tranq�ilo. J� tinha muita experi�ncia, tinha tocado em gafieira, coretos, conjuntos, at� em cima de caminh�o, fazendo propaganda para uma loja de tecidos na �poca muito conhecida no Rio de Janeiro, a Casas do Barulho. Ent�o toda essa experi�ncia, aliada aos estudos, fez com que eu n�o tivesse grandes dificuldades como maestro adjunto.
E: Quando o sr. assumiu a Banda como maestro?
JC: Eu assumi em 1983. O maestro Batista acabou n�o retornando. Lembro de um �timo concerto, que fizemos com a orquestra sinf�nica da UFF. Tem um fato que � bom ser lembrado: assim que eu assumi, em 1983/1984, a sinf�nica da UFF era lotada aqui na r�dio MEC. E a r�dio enfrentou alguns problemas, de forma que a orquestra ficou sem lugar para ensaiar. Ent�o os maestros vieram aqui e pediram para que a orquestra pudesse ensaiar nas nossas depend�ncias. Se eles n�o encontrassem um lugar, a orquestra estava amea�ada de acabar. Nessa �poca, n�o hav�amos ainda sa�do do per�odo da ditadura militar, a disciplina era muito rigorosa. Levei o pedido deles ao comandante, que disse que n�o poderia permitir a entrada de 70 civis numa depend�ncia militar, a menos que eu me responsabilizasse. Ent�o decidi assumir os riscos. Assim, de manh� ensaiava a Banda e � tarde, a orquestra. Isso levou uns quatro, cinco meses. Na d�cada de 1990 fiquei at� uma temporada l� na UFF, com a orquestra.
E: Enquanto maestro da Banda, quais as lembran�as que o sr. tem?
JC: O que eu mais gostava de fazer eram os concertos na rede de escolas estaduais.� Pegamos uma �poca com o Brizola e uma �poca com o Moreira Franco. Os professores vinham at� aqui, faz�amos um programa do que iria ser tocado � era uma grande troca. Toc�vamos principalmente nas escolas de normalistas, como a Carmela Dutra e o Instituto de Educa��o, na Tijuca. Em apresenta��es de final de ano, reun�amos cerca de 5 mil alunos. Esse projeto vigorou at� 1991, n�o lembro ao certo. Essa � uma das melhores lembran�as que eu levo como maestro.
Entrevistadores: Como come�ou sua rela��o com a m�sica?
Oth�nio Benvenuto: Em crian�a, no Nordeste, ouvindo os instrumentos t�picos de minha regi�o. No Rio de Janeiro foi o impacto ao ouvir pela primeira vez uma �pera, cantada pelo grande tenor Beniamino Gigli.
E: Quando come�ou a tocar?
OB: Na Banda do Corpo de Bombeiros. Inicialmente toquei trompa, mas minha maior paix�o foi o obo�, instrumento que toquei antes de me tornar regente.
E: Quando come�ou na Banda e qual o maestro na �poca?
OB: Quando entrei na Banda, no in�cio da d�cada de 40, o maestro era o Il�dio Ant�nio Nascimento. A seguir, assumiu como maestro o m�sico Adjalme Rodrigues Silva.
E: Por que escolheu a Banda do Corpo de Bombeiros?
OB: Pelo encanto e pelo valor art�stico que ela transmitia a quem a ouvisse.
E: Quando assumiu como maestro?
OB: Em dezembro de 1962.
E: Como foi a transfer�ncia da Banda para Bras�lia? Quando foi? Quantos m�sicos foram e quantos ficaram?
OB: Foi em decorr�ncia de uma lei federal que dava direito a quem era do ent�o Estado da Guanabara de optar por Bras�lia. Em raz�o disso s� ficaram dois m�sicos no Estado da Guanabara: o sargento m�sico Ramos e eu, que na �poca era 2� tenente m�sico. Isso foi no in�cio do ano de 1963.
E: Como foi a reconstru��o da Banda nessa �poca?
OB: Foi o fato mais importante para mim, na hist�ria da Banda do Corpo de Bombeiros. Partimos praticamente do nada e organizamos uma banda de jovens, muitos dos quais se iniciando no instrumento. E em pouco tempo estava uma banda organizada, de m�sicos potencialmente talentosos, de tal forma que, com disciplina e trabalho, j� em 1965 conquist�vamos o primeiro lugar no campeonato de bandas militares.
E: Quais as modifica��es que o sr. fez no repert�rio? Tirou instrumentos, colocou outros? Por qu�?
OB: As modifica��es foram diversas � isso tanto no efetivo da Banda, que passou de 60 para 80 m�sicos, como tamb�m na organiza��o da mesma, que oportunizou nova estrutura. Por via de conseq��ncia, com uma banda maior e naturalmente reestruturada, tivemos oportunidade de aumentar o repert�rio, sem desrespeitar os princ�pios seguidos por Anacleto de Medeiros. Passamos a executar um repert�rio sinf�nico mais ampliado, assim como os instrumentos musicais, no que foi poss�vel. Isto sem modificar tanto a sonoridade, que em princ�pio foi a mesma de Anacleto de Medeiros. O que se fez foi ampliar a Banda com as modifica��es do novo efetivo e introduzir instrumentos como harpa, mais fagotes e mais clarinetes. A percuss�o foi ampliada e houve a introdu��o de um sargento arranjador e um sargento orquestrador. A mesma banda de Anacleto de Medeiros tomou nova fei��o, sem deixar de ser uma banda cujos princ�pios foram cuidadosamente respeitados.
E: Qual a import�ncia de Anacleto de Medeiros?
OB: Anacleto � nosso mestre; deixou escola imut�vel. Todos os maestros do passado o seguiram. Anacleto criou uma banda modelar.
E: E Pinto J�nior?
OB: Depois de Anacleto eu considero Pinto J�nior outro grande mestre da Banda. Foi um dos maiores orquestradores de pe�as eruditas e rom�nticas, assim como um compositor respeit�vel e um diretor meticuloso e competente.
�E: Quem � Estev�o? O sr. ouviu falar de algum Estev�o na Banda?
OB: Me � desconhecido e acredito mesmo que n�o tenha feito parte da hist�ria oficial da Banda do Corpo de Bombeiros.
E: Quais os momentos mais marcantes da Banda?
OB: Numa primeira fase, dois momentos foram marcantes. No primeiro momento, a Banda era desorganizada e houve luta pela organiza��o da mesma. O segundo momento foi uma luta de bravos, quando conquistamos o campeonato de 1965, j� com novos m�sicos. A partir da�, em agosto de 1973, seguiram momentos de sucesso: concertos memor�veis, viagens, instrumental novo etc.
E: A Banda fazia muitas excurs�es?
OB: Exceto uma excurs�o ao Paraguai, as viagens eram a estados pr�ximos ao da Guanabara, mas as atividades eram intensas em concertos, temporadas e apresenta��es diversas.
OB: Quando o sr. saiu da Banda?
OB: Em agosto de 1973, quando assumi como professor titular da Universidade Federal de Santa Maria (RS).
E: Fale um pouco sobre o que sr. sabe a respeito de Luiz Paulo e Dion�sio Rosa Reis.
OB: Fui instrumentista com o maestro Luiz Paulo. Sempre o achei pessoa distinta e m�sico competente. Guardo do maestro Luiz Paulo saudosa memória. Quanto a Dion�sio, de quem fui contra-mestre, posso dizer que era um m�sico muito organizado, s�rio e trabalhador. Fiquei com ele, infelizmente, pouco tempo, por motivo de aposentadoria mesmo.
E: O sr. tem algum contato com a Banda hoje?
OB: O contato � pouco, pois fiquei todo esse tempo no Sul do pa�s. Mas as vezes que� tenho s�o motivos de estima e admira��o, pelos maestros que me precederam, pelos m�sicos e pela administra��o do Corpo de Bombeiros.
E: Fale um pouco sobre a Banda no cen�rio musical do seu tempo.
OB: Tanto no meu tempo quanto nos tempos atuais a import�ncia da Banda � essencial para a cultura do Rio de Janeiro. Haja vista que se trata de uma organiza��o com mais de cem anos, atuando ininterruptamente na cidade e considerada por todos como uma organiza��o respeitada e estimada.
E: Qual a import�ncia da Banda no cen�rio musical brasileiro da atualidade?
OB: As bandas, tanto civis como militares, s�o organiza��es indispens�veis � cultura. Colocam-se entre a m�sica popular e a m�sica sinf�nica e desempenham um papel essencial de interm�dio entre o erudito e o popular.
7. Entrevistado: Silvino Lemos, em 20 de fevereiro de 2004.
Entrevistadores: Maestro, pedimos que o sr. comece dizendo seu nome completo, local e data de nascimento.
Silvino Lemos: O meu nome � Silvino Jos� Lemos, nasci em 16 de setembro de 1947, numa cidade do interior do estado do Rio, Sapucaia.
SL: Desde pequeno. Eu sempre gostei de m�sica � cantava, assobiava... Meu pai tocava viol�o �de ouvido�. Meu tio tamb�m. Eu comecei a estudar m�sica com quase 19 anos, na Sociedade Musical Carlos Gomes, em Al�m Para�ba, Minas Gerais.
E: O que o sr. ouvia na �poca?
SL: Eu gostava de ver a banda de m�sica tocando, os dobrados e aquelas m�sicas t�picas de banda do in�cio do s�culo, como as polcas. Era aquela m�sica que eu queria tocar.
E: Qual o instrumento que o sr. escolheu?
SL: Clarineta. Eu vim para o Rio e estudei na Escola de M�sica da UFRJ com o professor Geraldo dos Santos � na ocasi�o, o titular da cadeira.
E: Por que o sr. decidiu entrar para a Banda do Corpo de Bombeiros?
SL: Eu morava em Friburgo e sempre via a Banda do Corpo de Bombeiros tocando na TV Globo, num programa chamado Concertos para a Juventude. Eu me tornei f� daquela banda e quando algu�m sugeriu que eu poderia fazer um concurso para uma banda militar, escolhi a do Corpo de Bombeiros. Fiz o concurso em setembro de 1971 e comecei na Banda em 16 de janeiro de 1972.
E: O sr. ficou l� por quanto tempo?
SL: Fiquei na Banda por 31 anos. Como sargento eu fiquei at� 1985. Depois fui promovido a oficial e assumi a Banda como maestro em outubro de 1993.
E: Nesse tempo, quais os momentos que o sr. considera mais importantes na Banda?
SL: O primeiro mais importante pra mim foi quando eu fiz um solo numa apresenta��o em Friburgo. Agora, para a Banda, o que marcou foi uma excurs�o � Alemanha em 1980.
E: Como foi a excurs�o?
SL: Ficamos 16 dias. Foi muito bom, saiu nos jornais das cidades alem�s. Eu tenho c�pia do jornal.
E: Quais os outros eventos importantes? A Banda fazia muita excurs�o?
SL: A Banda viajava muito, pelo Brasil mesmo. Minas Gerais, Esp�rito Santo, j� fomos a Recife... O Estado do Rio todo j� visitamos. Eram freq�entes as apresenta��es fora da cidade � a Banda recebia muitos convites. E vale registrar que a Banda viajava sempre completa � �ramos por volta de 80, 90 m�sicos.
E: E os seus momentos mais importantes na Banda?
SL: Foi a partir do momento em que eu assumi a Banda, em 1993. O momento culminante foi o centen�rio da Banda, em 1996, no Teatro Municipal. Foi uma �nica apresenta��o e nessa ocasi�o o maestro Oth�nio Benvenuto foi convidado para reger parte do concerto. Eu consegui colocar no teatro um coro com 780 vozes. Foi muito bonito e est� tudo documentado. Existe um v�deo e o programa da pe�a.
E: E os principais maestros na Banda, quais s�o, na sua opini�o?
SL: O Anacleto de Medeiros � na �poca, uma pessoa muito conhecida aqui no Rio de Janeiro, no meio musical, um grande compositor. Depois dele, uma outra refer�ncia � o Albertino Pimentel, o Carramona, que tamb�m tem muitas composi��es e arranjos, v�rios choros gravados. Depois, o maestro Ant�nio Pinto J�nior, que ficou 21 anos � frente da Banda, autor do hino da corpora��o, o Soldados do Fogo. Pinto J�nior tamb�m � o autor do arranjo oficial do Hino Nacional Brasileiro. Ele foi promovido a capit�o por merecimento � na ocasi�o, a patente m�xima na Banda era segundo tenente. Depois dele a patente m�xima voltou a ser tenente novamente. Tamb�m posso citar o Dion�sio Rosa Reis, autor do arranjo oficial do hino Cidade Maravilhosa, que gravou LP�s de marchas-rancho e bateu recordes de venda. Mais recentemente, o maestro Oth�nio Benvenuto. Quando assumiu a Banda, s� havia ele e mais dois m�sicos. A Banda foi, junto com a capital da Rep�blica, para Bras�lia. Ele teve que reconstru�-la.
E: Ela foi reconstru�da nos mesmos moldes?
SL: N�o, ele melhorou a estrutura.
E: Como o sr. v� a Banda hoje?
SL: A Banda hoje tem um n�mero de m�sicos maior, e m�sicos muito bons. O processo seletivo � rigoroso e a qualidade se mant�m. Est� muito bem entregue hoje ao Tenente Efraim, e h� um ano est� subordinada ao Centro Hist�rico e Cultural, criado recentemente. Ah, existe uma hist�ria curiosa, de quando a Banda foi tocar numa cidade do interior. Ao lado do local da apresenta��o, havia um curral, e algu�m de brincadeira abriu a porteira e os bois vieram na dire��o da Banda, que estava se apresentando. Na hora foi um corre-corre, mas depois foi engra�ado lembrar do epis�dio.
Depoimentos
Depoentes:
· Marcos Campos, em 26 de maio de 2004. Fagote.
Os depoimentos
1. Depoente: Marcos Campos, em 26 de maio de 2004.
Marcos Campos nasceu em Cordeiro (cidade pr�xima de Nova Friburgo, no estado do Rio de Janeiro), em 30 de agosto de 1961. Seu pai tocava viol�o (n�o profissionalmente) e incentivou o interesse do filho pela m�sica. Aos 10 anos, Marcos come�ou a aprender saxofone numa banda de m�sica da cidade.
Aos cerca de 20 anos, prestou concurso para ingressar na Banda do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro. J� conhecia e admirava a Banda, que havia se apresentado na cidade algumas vezes, e j� a havia visto na televis�o, no programa Concertos para a Juventude.
Quando come�ou na Banda, o maestro era Jo�o Baptista Gon�alves. Segundo Marcos, o maestro era bem relacionado politicamente, al�m de bom administrador. Em sua gest�o, a Banda participou do Projeto Aquarius. Havia �nfase no repert�rio erudito.
Jos� C�ndido, sucessor de Baptista, era �timo maestro. Reduziu o n�mero de instrumentos de cordas. Era ousado no repert�rio e fez novos arranjos de m�sicas eruditas para a Banda. O n�mero de componentes girava em torno de 60 nesta �poca. Com o maestro Jos� C�ndido, Marcos deixou o sax e come�ou a tocar fagote, instrumento pelo qual sempre teve curiosidade.
Com o Cap. Silvino, ocorreram algumas mudan�as: instrumental novo, mulheres come�aram a ser admitidas e o n�mero de componentes aumentou (em fun��o de aposentadorias, reformas, exonera��es etc., a Banda chegara a ter apenas 55 componentes). Al�m disso, os crit�rios para promo��o mudaram, tornando-se mais flex�veis.
Atualmente, um fato chama a aten��o: cerca de 95% dos m�sicos declaram-se evang�licos. O n�mero de m�sicos gira em torno de 100 e a maior parte deles tem n�vel universit�rio. A m�dia de idade gira entre 25 e 35 anos.
O tenente e atual maestro, Efraim Berto, tem feito algumas mudan�as: o repert�rio � mais atual e popular e h� mais �nfase em instrumentos como obo�, clarineta e saxofone.
Hoje em dia Marcos �, como os demais subtenentes, mestre de m�sica. Em poucas palavras, ele � o respons�vel por conduzir e reger a Banda (ou um grupo de m�sicos, que nesse caso comp�em uma tocata) em eventos. Os demais subtenentes s�o: Aurimar, Neto, Gomes, Elias, Moura, Eliezer e De Souza.
2. Depoente: Silvino Lemos, em 20 de fevereiro de 2004.
Maestro Silvino Lemos inicia a entrevista tecendo elogios ao cel. Rubens Jorge, que teria dado mais autonomia � Banda. Na gest�o do cel. Rubens, a Banda adquiriu instrumental novo e gravou dois CD�s, o Hinos de Pa�ses e o Banda do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro Interpreta Cl�ssicos. Com o cel. Paulo Santos a Banda gravou o CD Hinos do Nosso Brasil.
Quando era maestro da Banda, Silvino realizou v�rios concertos (o principal, de acordo ele pr�prio, foi o do centen�rio da Banda, em 1996), e tocava principalmente repert�rio erudito. Ele afirma ter trabalhado para que os m�sicos pudessem alcan�ar a patente de major (e conseguiu, sendo eles brevemente promovidos). Tamb�m em sua �poca como maestro, depois de algo em torno de 10 anos sem concurso, entraram cerca de 52 m�sicos na Banda. Al�m disso, o maestro introduziu o baixo el�trico, a guitarra e o teclado; a Banda adquiriu computadores; as mulheres puderam prestar concurso pela primeira vez (atualmente s�o cerca de 6 mulheres).
Silvino acha que alguns maestros devem ser lembrados: o Paulo Silva (que gravou o LP com as marchas-rancho), o Jo�o Baptista (que criou o coral do CBMERJ, que teve dura��o curta, de cerca de dois anos apenas) e o Dion�sio Rosa Reis (porque � o autor do arranjo oficial do hino da cidade do Rio de Janeiro, o Cidade Maravilhosa).
Anacleto de Medeiros nunca foi esquecido, segundo o maestro Silvino. Silvino e Baptista, quando � frente da Banda, tocavam m�sicas do Anacleto com arranjos originais. J� o maestro C�ndido gostava de fazer arranjos pr�prios para as m�sicas do Anacleto.
[1] SALLES, Vicente. Sociedades de Euterpe. Bras�lia: edi��o do autor, 1985. p. 19.
[2] DAMI�O, Jos� Pedro. Tradicionais bandas de m�sica. Pernambuco: edi��o do autor, 1970. p. 53.
[3] MEIRA, Ant�nio Gon�alves & SCHIRMER, Pedro. M�sica militar e bandas militares: origem e desenvolvimento. Rio de Janeiro: Ombro a ombro, 2003. p. 34.
[4] TACUCHIAN, Ricardo. Bandas de m�sica: anacr�nicas ou atuais? In: Revista da Escola de M�sica e Artes C�nicas da Universidade Federal da Bahia. Salvador: jan/mar 1982.
[5] GON�ALVES, Alexandre. O Choro. Rio de Janeiro: FUNARTE, 1978.� p. 146
[6] Depoimento de Oth�nio Benvenuto.